Como já mencionei no artigo anterior,  Fritz Müller, ao discordar de parte do texto do juramento obrigatório para o exercício da profissão de médico, inicia processo com pedido de alteração do mesmo, com a seguinte petição.

Para a Faculdade de Medicina,

Nas mãos do decano em exercício, Senhor Professor Dr. Litzmann

Nesta

 

Pedido do estudante F. Müller                Greifswald,  21 de outubro de 1848.

Relativo ao juramento na diplomação

No sentido de dirigir uma petição ao Ministério da Educação para conduzir acesso ao exame rigorosum, tomo a liberdade de anteriormente solicitar o parecer da mui honrada Faculdade de medicina sobre um ponto, para saber se porventura ainda necessita de uma informação especial junto ao Ministério acerca do assunto.

Trata-se da prestação de juramento na solenidade diplomação.

Em consequência da revolução de março, também na Prússia encontra-se proclamado o princípio de independência integral dos direitos civis de um determinado credo religioso. As eleições em Frankfurt e Berlim transcorreram de acordo com o referido princípio. Seria, pois, um tapa na cara desse princípio caso a aplicação de uma forma de juramento baseada em uma certa confissão de fé fosse mantida como condição imprescindível da diplomação e com isso cortasse o caminho da profissão médica a todos àqueles que não partilham confissão de fé – como o fez o Ministro Eichhorn por meio de uma sugestão vergonhosa.    

Neste caso, devido à minha convicção religiosa, parece que estou impedido à prestação do juramento de praxe. Por essa razão, solicito a essa mui honrada Faculdade por informação propensa: se esta (Faculdade), sem demais – como simples consequência da cláusula de igualdade de todas as confissões –  proclamada pelo rei em março e praticamente reconhecida pelas armas, concede-me, no lugar do juramento médico obrigatório com as palavras sient deus me adjuvet et sacrocantum ejus evangelium, assumir com uma simples promessa no lugar do juramento, – ou se a Faculdade acha necessário submeter e deixar o assunto a critério do Ministério.

No aguardo de uma propensa e pronta resposta,

Atenciosamente

  1. Müller, estudante de medicina

Gratioso medicorum

Ordini!

Na sequência deste pedido, seguem as Atas (traduzidas) e seus originais, onde é possível observar quem foram os envolvidos e qual foi o posicionamento adotado pelos mesmos.

 

 

Ata da faculdade de medicina relativa à petição do Dr. Müller no tocante à mudança da forma de juramento nas formaturas de medicina, em benefício e na acepção da sociedade livre. 1847, idem 1848.

Mui honrados senhores colegas,

Após ter alterado o texto na forma combinada, atendendo os pedidos do Dr. Müller dirigidos aos procuradores governamentais, apresento-lhe o documento para sua prestimosa assinatura. Greifswald, 2 de fevereiro de 1847.

Dr. Berndt

Já por mim assinado.

                                   Schultz

 Igualmente             Litzmann

                                Baum

 

 

 

 

 

Segue então, o retorno enviado pela Faculdade de Medicina.

De acordo com o retorno pelo Superior Despacho Ministerial de 22 de setembro da petição do estudante de medicina Dr. [em Filosofia] Müller, devido à limitação do quadriênio legal a um triênio, forneço a portaria da tentativa de retirada do juramento usualmente prestado na diplomação da formação médica, relatando fielmente como segue.

Primeiramente, no tocante à redução do tempo de estudos do Dr. Müller a um triênio, permitimo-lo em função da dedicação e proficiência do candidato, em especial, consenti-mo-lo em consideração à circunstância do estudo dos artigos platonistas, estudo esse que, aliás, cabe ao quadriênio da academia de medicina, Müller já ter absolvido em seu período de estudos de Filosofia.

No que diz respeito à portaria do ensaio filosófico, a norma legal de 7 de janeiro de 1826, na qual encontra-se decretado o pretendido ensaio, determina sob nº 5, que aqueles candidatos que conquistaram o doutorado em Filosofia junto a uma Universidade do país, estariam dispensados do referido tentamen.

Como Müller obteve o doutorado em Filosofia na Universidade de Berlim, a presente questão da norma adicional, terá que encontrar aplicação legal.

Que a forma habitual de juramento na diplomação da medicina contemple as palavras Ita me Deus adjuvet et sacrosanctum ejus evangelium. Ela tem sido observada bem generalizadamente, não contemplando nada de indecoroso, segundo nossa opinião. Como até o momento falta uma norma legal, ou seja, qual procedimento adotar frente ao juramento dos adjuntos, a faculdade continuará com o dever de observar a norma vigente, só podendo desejar que seja do agrado de Sua Excelência conseguir uma normal suplementar legal. [ilegível] Procurador Imperial Extraordinário. [ilegível] Presidente Dr. v. Nohlen  [ilegível]

Até agora vigora a norma legal para prestar o juramento da diplomação de médico de modo que podemos apenas zelar para que ela seja seguida corretamente.

Não cabe a nós julgar até aonde Sua Excelência, o Senhor Ministro, poderá estar convencido a abrir uma exceção, frente a um único candidato.       

                                  Greifswald, 29 de outubro de 1847

                                  Faculdade de medicina.

Gratioso Medicorum

Ordini

A análise sobre o pedido não ficou apenas no âmbito da Universidade de Greifswald, chegando até o Superior Ministério, como demonstram os documentos abaixo.

 

 

Mui honrados senhores colegas!

Por este meio, tenho a honra de, no anexo, levar muito atenciosamente aos senhores, para tomarem prestimoso conhecimento do ofício do senhor procurador governamental, por meio do qual, nos é comunicada por escrito a decisão do Superior Ministério referente petição do estudante de medicina, Doutor em Filosofia, Müller, a respeito da dispensa do juramento na diplomação.

Greifswald, 19 de fevereiro de 1848

Litzmann

Agradeço pelo comunicado

                                                                  Schultz

——                                                        Berndt

——                                                        Baum

 

 

 

 

A seguir temos a tradução do Documento enviado pelo Superior Ministério à Faculdade:

Cópia autêntica

  1. 17/2 48 Li[tzmann]

Em resposta ao relato nº 17 de 31 de [ilegível]  peço que Sua Excelência faça o estudante de Medicina, Dr. em Filosofia, Friedrich Müller, saber que em atenção à petição deste, pela dispensa [liberação (de uma obrigação)] da prestação do voto de juramento previsto nos estatutos daquela Faculdade de Medicina e devido pelos formandos, tendo em vista que ele, até o momento, não se filiou a nenhuma sociedade religiosa, fato que faz com que estes associados sejam liberados da obrigatoriedade da prestação do juramento, o qual é a norma legal vigente, e como no presente caso se trata do cumprimento de preceitos estatutários, ele não poderá ser dispensado da prestação do juramento alusivo à conquista do doutorado em Medicina.

Berlim, 10 de fevereiro de 1848.

Ministro das Questões Religiosas, de Ensino e da Medicina.

[ilegível] Eichhorn

Ao Procurador Extraordinário do Governo Imperial, Conselho secreto da Justiça, senhor presidente consistorial, Dr. von Nohlen

3825 da nobreza de Greifswald

A cópia da presente resposta é recebida pela Faculdade de Medicina para que tome conhecimento.

Greifswald, 16 de fevereiro de 1848.     

Procurador Substituto do Governo Imperial, Nohlen

 

À altamente louvável Faculdade de Medicina

Nº 31                      Aqui no local

 

Segundo entendimento do Procurador Substituto do Governo Imperial, o estudante de Medicina em questão, ainda deveria realizar o juramento tal como estava estabelecido, pois a dispensa só se justificaria no case de Müller ser filiado a uma associação religiosa, o que não ocorreu até o momento do pedido.

Sendo assim, por uma questão de ordem legal no cumprimento do estatuto da Universidade, Fritz Müller continuava obrigado a fazer o juramento para obter a diplomação em Medicina.

Por fim, mesmo encaminhando sugestão de alteração da forma de juramento, Fritz Müller continuou obtendo negativa ao seu pedido, como demonstram os documentos finais do processo.

“Mui honrados senhores colegas.

Tenho a honra de, no anexo, comunicar aos senhores a petição do estudante de Medicina Müller, com relação à alteração da forma do juramento no ato da diplomação. Caso os mui honrados senhores colegas estejam de acordo, eu encaminharia a resposta de tal modo que a Faculdade não teria a competência de conceder arbitrariamente uma divergência da forma de juramento em vigor até o momento e por isso teria que submetê-lo à decisão do Ministério Superior, ao qual é subordinado. Mui atenciosamente peço por sua manifestação.

 

Gr. 23/10 48                       Litzmann,

Peço o visto do Reitor em 23/10 48.

                                                           Schultz

                                                           Berndt idem

                                                           Baum idem

Como podemos observar, por meio dos registros apresentados, o pedido de Fritz Müller, para alteração do juramento obrigatório para obtenção do diploma de Medicina foi negado, tendo recebido a decisão do Superior Ministério, ratificada pelo Dr. Litzmann, acompanhada de Schultz, Berndt e Baum.

 

 

Ana Maria L. Moraes

Ana Maria L. Moraes

Pesquisadora e Historiadora