Fritz Müller descobriu um fenômeno evolutivo muito interessante. Cooperação evolutiva entre animais e vegetais. Milhões de anos de convivência próxima ensinaram a habilidade cooperativa entre a Embaúba e as Formigas Aztecas. As formigas aprenderam a habitar no oco da planta e tinham ali alimento, uma seiva açucarada suficiente para sobreviverem. Esta seiva é chamada de Corpúsculos Müllerianos, fazendo justiça a ele. A contrapartida natural do aprendizado evolutivo favorecedor da sobrevivência exitosa das formigas foi protegerem a Embaúba de herbívoros e de predadores. Ao detectarem herbívoros põe suas fileiras em ataque de proteção. Ambas ganharam com esta soma ótima e cooperativa e aí estão harmoniosamente vivendo até nossos dias, aqui mesmo ao nosso redor, nas matas de Santa Catarina. Até esta constatação chegou o maravilhado Fritz Müller, e a mais não poderia chegar com os poucos meios de que dispunha para suas pesquisas, um microscópio, referências teóricas e sua rara inteligência observadora da natureza com quem convivia numa relação muito extraordinária. Se tivesse os meios atuais de pesquisa iria descobrir algo que, talvez, o perturbasse moralmente. A evolução que tanto favoreceu a Embaúba acrescentou uma pitada meio sinistra ao seu método, digamos assim. A seiva açucarada que ela produz altera o sistema digestivo das formigas, de modo que não pode processar nenhuma outra seiva alimentar similar existente em outras plantas. Um bloqueio, fruto do acaso ou da habilidade evolutiva desta planta? As formigas restaram escravas portanto do meio estrito de sua sobrevivência?

Naqueles anos da metade do século XIX dilemas morais eram frequentes, ao lado dos avanços e das fantásticas constatações dos heroicos pesquisadores. O dilema moral que aventamos está no aparente excesso de zelo auto protetivo da planta capturando a sua protegida formiga Aztecas num regime perpétuo de prestação de serviços, em troca de alimento tão espeializado. E só aquele alimento as alimenta e nenhum outro mesmo que similar existente em outras plantas. Uma malícia na natureza tão perfeita, bela, esplendorosa? Müller deve ter observado bem a movimentação enérgica, rápida, feroz mesmo das formigas quando percebiam a presença de qualquer predador ameaçando a Embaúba. Pagavam com a vida na proteção da sua fornecedora de alimento. Talvez tenha especulado que de fato estavam protegendo a si mesmas, ao seu mundo de sobrevivência. Bem, impossível saber o que pensou, as teses diversas que ia formulando, encontrando uma solução melhor que esta nossa especulação literária sobre vir a viver a descoberta que referimos com o acréscimo de um dilema moral, face o jogo malicioso desta cooperação. Ele por certo, qualquer que fosse a inteligência natural primitiva neste episódio evolutivo, absolveria a Embaúba e suas hóspedes forçadas, as formigas Aztecas. E seguiria vendo a sua volta sempre mais evidências e a nítida comprovação da sobrevivência dos que melhor se adaptam às circunstâncias. Quantas milhares de plantas e de animais desapareceram na milenar caminhada das espécies? Os menos aptos, menos flexíveis, menos destinados a prosseguir rumo a um futuro desapareceram, deixando sinais de sua existência tão somente em seus restos fossilizados ou no melhor aproveitamento de algum traço seu quando percebidos na incorporação por outros espécimes que sobreviveram. Esta dupla que aqui abordamos sobreviveu muito bem.

Ele, Fritz Müller, em seu íntimo contato com a natureza poderia mesmo dizer que era tal sua interação com ela que sentia ser na verdade ela mesma. Teria ele percebido que não precisava forçar a natureza e entregar-lhe seus segredos? Que seu desejo de buscar os segredos que nos ajudassem a sair do desconhecimento prospectando a natureza era, de certa maneira, permitido naturalmente pela Natureza? Que ela, em contrário a sua condição de ser fechada em si mesma, a não permitir que seus segredos fossem revelados, se abria para ele? Será que este solitário cientista perdido nas nossas florestas e nos litorais de Santa Catarina poderia sentir que circulava em seu interior a mesma seiva que circula na grande Natureza? Que ele não pesquisava a Natureza, era a Natureza? Talvez, poeticamente, se poderia dizer que andava sempre descalço nas matas buscando alimento para seu espirito? Bem, não importa o que achamos hoje, ele seguia nas suas pesquisas por  Santa Catarina encontrando novos fatos, que iam se abrindo a sua frente. Ele sempre mantinha os olhos bem abertos.

Mas se queres saber mais sobre ele, sobre sua vida, suas pesquisas, seu inestimável valor para o avanço real da ciência, siga neste site…

Marcondes Marchetti

Marcondes Marchetti

Coordenador do Grupo Desterro Fritz Müller
Charles Darwin 200 anos